28 de jun. de 2010

Corredores compridos com finais curtos

Mais um dia que atravessava os mesmos dois lances de escadas daquele corredor branco vazio com paredes já não mais tão brancas, cheiro de desinfetante e luzes fracas. Era o pior momento de seu dia: a chegada na repartição. Todos se movimentavam e falavam ao mesmo tempo e sua cabeça todos os dias estava prestes a explodir. Se sentia um ponto preto, mas não tão preto, minúsculo e quase inexistente em meio a aquelas mesas, paredes e chãos brancos não tão brancos. Se distraía com sua imaginação e se concentrava com o seu estar a parte e já não sabia mais no que pensar. Repetia frases feitas para amigos e já não tinha paciência de inventar sentimentos e emoções. No seu interior apático não ansiava por aventuras e tempestades, apenas por sossego: pensava ser essa a solução para seu fingimento de dor e a sua constante insatisfação.
Na chegada do trabalho andava pelo corredor que começava seu apartamento e parecia que ele jamais acabaria e nunca encontraria nada. Descontava sua solidão em cartelas de dorflex e sentia as costas doídas sempre que deitava. Ansiava por um café, mas nunca queria afastar aquela sensação de cansaço. A dor de cabeça seguia constantemente.
Tentava fugir dos finais de semana. Sem trabalho e faculdade a vida era mansa, mas era só. Ela dizia gostar de ser só, mas fazia parte do seu papel representado. Se afundava nos travesseiros e edredons infantis e fingia não ligar. Ouvia seu interfone tocar e apenas se virava na cama. "Era engano", pensava ela.
Em final de semana chuvoso e frio, buscou tentativas para se livrar do medo, que doía mais que a solidão. Tentou jogar partidas de sinuca, mas as bolas nunca caíam na caçapa. Revirava o bar por diversas vezes atrás de uma companhia qualquer. Era bonita, era notada, mas sempre estava só.
Saiu correndo e se atirou nas gotas que já caiam grossas. Não se importou em borrar a maquiagem, nem em seu penteado desfeito. Ao chegar em casa sentiu as orelhas queimarem e lembrou de ditados sexagenários. Passou um café na sua cafeteira verde, acendeu um cigarro e caiu no sono em sua sacada.

21 de jun. de 2010

de passadas curtas e olhares longos

e ouvia despretenciosamente enquanto tentava acelerar as passadas. me pedia para escutar, mas ao voltar minha atenção já não falaria mais. eu lembrava de apegos e desapegos, noites mal-dormidas, pensamentos vagos e discordância trocadas. o frio me cortava por fora, a incerteza por dentro. me dizia que não entendia, que eram opostos. lembrava da canção que dizia que 'os opostos de distraem e os dispostos se atraem'. andava disposto, mas andava com medo. o sorriso havia voltado, mas girava tantos outras confusões no meio de poucas certezas. dessa forma me impedia e via o teu auto-impedimento idem. andava desgastado e sem deixar a empolgação me tomar. lições de vivência. e tu me falava tudo e eu me impedia de chorar. mantinha a pose. fingia uma certeza inexistente e saberia que a falta estava por vir. não sabia o que fazer de mim e não soube o que fazer de ti. fui teu.

14 de jun. de 2010

O passar dos anos e a maturidade sentimental da preferência nacional

Não entendo o motivo que convencionamos a chamar de experientes as pessoas mais velhas. Obviamente, se formos considerar o fato de terem vivido maior quantidade de situações adversas o adjetivo pode ser até bem aplicado, mas ao considerar experiência como sinônimo de maturidade essa expressão deixa muito a desejar. Principalmente se tratando de sentimentos. Ando cansado de falar de mim mesmo - que são os únicos sentimentos de homem que entendo. Então tratarei das mulheres.
Algo que sempre pensei durante a adolescência era que mulheres balzaquianas (trintonas) eram bem resolvidas, sabiam o que queriam, tinham a vida encaminha, ou seja, todas aquelas coisas que os nossos pais nos dizem que temos que ter resolvido ao chegar aos 30. Iludia-me com esse pensamento e sempre admirava as ditas trintonas. Pensava eu: "Nossa, além de ter uma baita estrada na cama, elas sabem o que querem. Já chegam por cima." Claro que algumas delas realmente são assim, mas normalmente essas se deram bem (financeiramente falando) ou são casadas. Tratando de mulheres solteiras, a idade é inversamente proporcional à maturidade sentimental.
Com o passar do tempo comecei a me envolver com as diversas faixas etárias de mulheres ainda me iludindo que a ideal só poderia ser balzaquiana ou quase lá. Toda aquela experiência e a individualidade seriam um sonho. Claro que o corpo já estava começando a declinar, mas isso não é tudo e muitas ainda não chegaram nessa fase. Balde de água fria e choque de realidade.
As mulheres de vinte anos ainda não tem experiência em relacionamentos, tiveram, no máximo, um ou dois namorados, não sofreram grandes desilusões, nunca foram pedidas em casamento, e o corpo estava no ápice de toda a vida. Com isso se tornam independentes, ainda conseguem dar risadas com os problemas, não criam expectativas gigantescas, se contentam com a companhia das amigas, ainda conseguem levar relacionamentos sem ansiarem loucamente por um casamento ou por algo que o valha. Ou seja, ainda existe muita vida pela frente e, assim, ainda conseguem levar a vida de forma leve e os relacionamentos idem. Não aceitam traições. Existem mil possibilidade e então não há porque passar por isso. São seguras de si.
A vida corre e passam a se decepcionar, já sofreram o bastante pra não confiar à primeira vista, mas por outro lado a carência vai aumentando. Não se encantam tão facilmente como no início da vida adulta, os olhos não brilham mais tão facilmente, a energia para paixões já não é a mesma, mas ao se apegarem a armadilha está armada. As amigas que outrora estavam sempre do lado aparecem casadas ou grávidas e, assim, o desespero só vai aumentando. A necessidade de ter alguém do lado da mesma forma e a paciência para aguentar problemas diminui, mas mesmo assim a paciência de aguentar o tempo sozinhas também é menor. Aceitam traições, defeitos e justificam isso como sendo seguras de si, mas não aceitam ouvir que já não existem tantas possibilidades e não tem mais vontade, paciência, disposição de começarem de novo.
Não faço apologia às novinhas e, muito menos, diminuo as balzaquianas, mas, claramente, notei que todas as minhas expectativas de experiência sexual e sentimental não andam juntas considerando a vida das mulheres. A solução do problema? Não faço a menor idéia. Dai-me paciência, Senhor!

13 de jun. de 2010

As mulheres da minha vida

MD me ensinou a tornar a própria vida textos literários. Tristes, realistas e carregados de emoção, como a vida deve ser. Descrever fatos de nada adiantaria. O interno acaba corrompendo todas as barreiras de apatia e dureza de coração. A cada novo soco, uma nova dor; a cada dor, uma nova pessoa. Lágrimas são pouco. É de cortar.

CL me mostrou que atos não são nada diante de sentimentalismos em literatura. Banalidades são o objeto-mor desta arte. Até baratas podem compor romances. O trágico se torna cômico e a leitura dá um frio na barriga e uma impressão de se estar ficando transtornado. A paixão faz o mesmo. CL me mostrou que a literatura é como a paixão.

Com a Ana C. não aprendi a viver, aprendi a escrever. Soube que em literatura não precisa de personagens, cenários, diálogos imaginários quando se vive. Passei a para de reclamar da minha vida, mas comecei a me lamentar. Não sou católico e não acredito em confissão, mas, por outro lado, acabei fazendo do papel o meu confessionário e da pena a minha penitência.

OD me falou de forma simples, mas terna. A poesia trazia o sorriso por vezes e a lágrima em outras. Não a abandonaria jamais.

Dentre todas as mulheres da minha vida, devo dar maior importância a HH. Com ela não chorei, não me lamentei, não aprendi a escrever. Dela eu apanhei. Ela me dizia tanta coisa que eu já não sabia se conseguia compreender, em frases sucintas me mostrava coisas tão evidentes que eu não enxergava. Tentei plagiá-la: não consegui. Ficava por dias sem comer e me afundava no copo toda vez que eu a encontrava. Já não me importava mais com meus quilos a menos e nem com o alcoolismo. Precisava desse fulgor que me incendeia em todas as vezes que eu a encontro.

O que o sábado que parece domingo acaba trazendo.

Insistia em escrever sobre coisas que já não fariam o menor sentido. O tempo andava estagnado: não sabia o que fazer. Narrava as coisas que me aconteciam e sempre dizia para que se cuidasse. Queria pedir que me cuidasse. Faltava coragem. Ela sabia o fazer, eu tinha esquecido. Lembrava de tempos não remotos em que se preocupava consigo mesmo. Hoje já não dava importância. E contava as história que o cercavam, mas acabava falando de si mesmo de forma indireta e pretenciosa. Ele sabia que ela não gostava de ouvir, mas não conseguia se calar. Ela só concordava e fingia que nem notava suas lamentações.
O frio cercava e ele não queria se levantar. Recebia propostas que não tinha a mínima paciência de cumprir, mas o tédio impedia de negar. Formulava desculpas retóricas que não sabe se adiantariam. Não levantava para escovar os dentes. O cuidado era menor e a falta de vontade de qualquer coisa só aumentava. A gêngiva sangrava e ele prometia para si mesmo fazer algo. As leituras ficavam pela metade e o dia passava devagar. Tinha pressa, mas o tempo não era seu amigo.
Pensava em coisas que já o desinteressavam. Pedia ajuda para a literatura, mas ela dizia que não conseguiria viver por ele. A garrafa dizia o mesmo e fazia a cabeça doer no outro dia, a beleza desarrumava a cama e não colocava a mesa.
Chorava, mas não sabia os motivos. Deixava os soluços que se apossarem. Eles vinham de tempos em tempos.
Sentou num banco de uma praça qualquer, a grama molhada impossibilitava de sentar no chão. Lembrava de história da noite anterior e via que nada mudava. Percebeu que as linhas andavam tortas. Sua escrita andava torta e não senti a mínima necessidade de mudar.
Ao chegar em casa tomou um café sem açúcar. Não impediu que o amargo se apossasse do resto de seu corpo. Assim ficou.

9 de jun. de 2010

Do peito côncavo e migalhas que devoraria

E eu gritava por não saber mais esperar. Tantas palavras, gestos, olhares e gozos trocados para ter o silêncio em retribuição. Buscava frases feitas para expressar a ausência. Clarice me explicava: retrato de um côncavo. Abria meu peito côncavo, mas as muralhas rapidamente se fechavam e ele seguia com seu vazio. Chineses me entenderiam. Muralhas instransponíveis cercavam de todo a região que um dia palpitou. Tentava plantar algumas sementes, mas flores jamais crescem em poços. A água já havia secado e a luz do sol já não alcançaria a terra ao fundo. O copo esvaziava, o maço de cigarros chegava ao fim, eu seguia no meu dilema e não saberia suportar. Ouvia promessas que não seriam cumpridas. Não daria mais atenção. Mentia pra mim mesmo. Lia as frases já esquecidas, abria os velhos livros e encontrava pétalas sem cores. Me sentia tonto e com náuseas: vomitaria todas as frases que haviam guardadas em uma carta que jamais enviaria. Me faltaria coragem para encarar a realidade. Elaboraria um diálogo se as palavras não me cortassem como cacos de vidro ao serem proferidas. Procurava o fundo do teu olhar, encontrava o auge da minha dor. Escrevia para esquecer, mas o fazria inutilmente.