3 de dez. de 2010

Picnic sentando em banco colorido

O que eu gosto do teu corpo é o sexo
O que gosto do teu sexo é a boca.
O que eu gosto da tua boca é a língua.
O que eu gosto da tua língua é a palavra.

Julio Cortázar

Com a mão espalhava a erva pela cunha. Numa tentativa frustrada de disfarçar a timidez, falava coisas sem sentido e não sabia como se portar. Cuidava-a com o canto do olho por temer fitá-la diretamente. Discutiam literatura e exercitavam seus narcisos interiores. Ela levara um camaféu para o picnic, mas ele chegara de mãos abanando. Temia perder-se entre divagações e palavras trocadas querendo encontrar-se em seus braços. Uma borboleta em meio aos leões e o seu francês bonito. As pilhas de livros mostravam suas leituras e o restante da estante empoeirava-se. Disfarçava o querer-lhe com piadinhas intelectuais. As promessas se enrolavam em grandes bolas e o sol insistia por transformar em água. Ele ansiava por mais um dia chuvoso em que ventasse e a neve resistisse por mais tempo até se consolidar.

28 de nov. de 2010

sinas de eterna ansiedade

o sofrimento não é minha sina,
tampouco a infelicidade.
já não acredito
na ideia ilusória
de ser feliz
e a dor
já se instala
em meu âmago.
o que me atormenta
é o acaso.

21 de nov. de 2010

A construção da felicidade, do amor e da religião

O grande herói grego habitante da cidade de Esparta entediava-se durante o período entre-guerras.
Depois de ter vivido tua sua infância em uma educação rigorosa, treinamentos árduos e uma disciplina exemplar; o sentido disso tudo se perdera.
Derrotaram todos os inimigos dos arredores de sua cidade-estado, conquistaram uma legião de escravos a ponto da população cativa ser ainda maior que a população livre. Tornaram-se conhecidos como os mais poderosos de todo o Velho Mundo.
Sem mais objetivo a ser atingido e cansado do ócio que era a única ocupação do exército após a última batalha, reuniu todos os guerreiros espartanos no senado.
Buscou sugestões sobre ocupações, discutiram e não chegaram a solução alguma. Mandaram chamar um sábio de Atenas, cidade vizinha.
O anfitrião ao chegor a cidade percebeu claramente o conflito e lembrou-se de sua infância quando passou pelo mesmo problema em sua cidade natal.
Disse para os soldados que três coisas importavam na jornada vital: dinheiro, sexo e limpar a consciência depois de colocar as duas outras coisas em primeiro lugar.
Após adquirir uma boa quantidade de dinheiro, o homem poderia dizer-se feliz. Depois de experimentar o sexo de diversas formas e com diversas pessoas e encontrar alguém que melhor satisfazesse poderiam dizer que amavam alguém.
A terceira busca era a mais complexa de todos, entretanto era a que mais poderia livrar do tédio. Após ser feliz e amar, os homens teriam praticado uma quantidade absurda de atrocidades contra si mesmos e contra os outros homens. Dessa forma necessitavam uma limpeza de consciência. Então formaram o papel de deus nas suas vidas.
A busca pelo encontro de deus deveria se dar após a conquista dos outros dois princípios afim de limpar os erros e ter uma vida plena.
O sábio disse que nunca encontrara, mas que o tédio nunca mais o havia artomentado também.
Com um ar pesado pensava na troca e fazia avaliações sem concluir nada.
Os espartanos nunca mais se entediaram, mas também nunca mais foram plenos.

7 de nov. de 2010

Poema da falta de tema

do absoluto eterno relativizado
ignorava verdades insípidas.
disfarça conhecimentos inexistentes
com discursos pré-concebidos.

falava de forma circular,
não pelo prazer de ser prolixo,
nem por exercício narcisistico:
masturbações lexicais.

muito falava para pouco sentido
e fingia que chegaria a teses inovadoras
mas no fundo do âmago e do Ser
carregava uma certeza

nada a dizer.

31 de out. de 2010

Como se os advérbios lhe retirassem a dor

Divagava pouco, mas falava de mais por estar alcoolizado. Gritava para que os sapos saíssem de sua garganta e ele pudesse respirar. Impulsivamente.
A ansiedade lhe consumia e não sabia se conseguiria aguentar por muito tempo. Esperava respostas e palavras que não sabia se um dia chegariam. Inseguramente.
O café não lhe descia e pensava na possibilidade de adoçá-lo: uma tentativa vã de adoçar sua vida que andava sem sentindo. Insensivelmente.
Tomava goles curtos como que para disfarçar que conseguiria. Dissimulava sentimentos e pensamentos em palavras vãs. Inutilmente.
Pensava em saltar janela fora, mas lembrara que morava no primeiro andar. Eis que chega um sopro no ouvido e ele se confunde. Tremulamente.

26 de out. de 2010

Primeiro dia: A mudança de caminho inesperada

Habituado no mesmo número de passadas por caminhos repetidos diariamente chegava ao trabalho alguns minutos atrasados. Entrava sorrateiro para que ninguém percebesse o adiantamento nos ponteiros do relógio. E, maquinalmente, sentava por detrás de sua mesa de trabalho e ainda como máquina repetia tarefas maquinais. No bater das badaladas do seu horário de saída percorria cabisbaixo seu caminho habitual de volta em direção ao ponto de ônibus como quem chega a um fim de um dia sem sentido. Apalpou os bolsos e descobriu seu maço de cigarros vazio: era obrigado a mudar a rota. Desgostoso dobrou na primeira esquina procurando algum boteco ou algo que o valha. Após caminhar dois quarteirões por ruas que pareciam infinitas em meio a imensidão cinza pode ver o lúmen e a fumaça engasgada entrar e sair de seus pulmões.
Não tragaria novamente e deixaria a cinza se formar na ponta de seu cigarro por boquiabrir-se diante dela. Andava cabisbaixa da mesma forma que ele: como quem chega ao fim de um dia sem sentido. Decidiu andar por trás de seus passos mesmo sabendo que não teria coragem de fitá-la longamente ou profundamente, sabia também não lhe dirigiria à palavra indango coisas banais ou demonstrando interesse em tê-la perto, mas a seguia.
Percorria o caminho dela de volta como se quisesse fazer parte de seu caminho e, dessa forma, tocar seu âmago. Distraidamente a seguia envolto em suas imaginações e divagações sendo quase atropelado e quase a atropelando por não notar que ela parara no ponto de ônibus. Imaginou que fossem vizinhos ou que pudessem morar próximos e que poderia a ver todos os dias no seu percurso ao trabalho e de qualquer forma pertencer a vida dela.
Aguardava ansiosamente que ela adentrasse na mesma linha que ele e, assim, pudesse descobrir onde morava. Inutilmente. Seu ônibus chegou e ela não embarcou. Desistiu de embarcar também para, ao menos, descobrir em que região da cidade ela morava. Aguardou pacientemente. Ela ensaiou um movimento, que ele notou pelo canto dos olhos, em direção ao ônibus que chegava. Pensou que poderia pegar aquela linha também, mas teria que caminhar o dobro do caminho costumeiro. Não mediu esforços.
Se alojou em um lugar do ônibus que não era muito próximo a ela, mas que poderia notar caso ela o fitasse e poderia a cuidar pelo canto do olho. Mesmo com o sol se pondo, colocou seus óculos escuros na tentativa de ficar em invisível em suas olhadas. Torcia, quase que, fervorosamente para que ela descesse em um ponto anterior ao seu. Inutilmente. Se aproximava da parada de ônibus e ela seguia imóvel. Calculou a distância e decidiu desembarcar um ponto após o costumeiro na esperança de que ela também o fizesse. Tampouco adiantou e voltou desconsolado para sua casa. Ela nem, sequer, notou sua existência.

13 de out. de 2010

Apalpava os móveis e as paredes que os ligavam lentamente buscando encontrar o caminho que levava a claridade. A luz havia cessado há alguns segundos pelos tiques do ponteiro dos segundos do relógio, mas haviam decorrido milhares de anos para ela. Ela o chamava e ele, como se suspirasse, pedia que ela se acalmasse. As suas pernas tremiam e ela via a sua falta de algo na escuridão que a cercava. Pelas frestas da janela notava que o restante da vizinhança também seguia sem luz. Ele seguia lhe dirigindo a voz para que se acalmasse e ela notava pelos sons que ele procurava algo. Lembrou de sua infância que sua mãe guardava velas na quarta gaveta da cozinha. Talheres na primeira, como em todas as casas que conhecia, coisas inúteis na segunda gaveta, panos de prato na próxima e velas no fundo da gaveta bem embaixo. Não conseguiu lembrar quando começara a temer a escuridão. Pior que o escuro eram as luzes que entravam pelas frestas das janelas e formavam formas que ela imaginava rostos e imagens carregadas de peso. Temeu sua escuridão interior que permitia a entrada de poucas frestas de luz. Não sabia o porquê de nunca ter aberto um espaço para a claridade entrar como se fosse um dia ensolarado em que a luz invade as janelas e esquenta todo o amibente e nem o motivo de ter deixado frestas no lugar da escuridão total que tentou manipular e impor a si mesma. Lembrara das faltas de luz mais freqüentes durante sua infância e se sentia tonta diante da lembrança de sensações e da busca de colos que, muitas vezes, demorava a encontrar.

9 de out. de 2010

Pintando as paredes do Ser claustrofóbico

Ser me dá claustrofobia. Vou me adentrando tão intensamente e fechando portas do âmago e da alma que perco o caminho aos poucos e o ar cada vez fica mais rarefeito. No meu interior as portas são de vidro e, assim, sou obrigado a ver tudo que se passa ao redor. Já tentei quebrá-los milhares de vezes inutilmente pensando que dessa forma deixaria de ser.
Comprei uma tinta fosforescente e, hoje, comecei a pintar a parede mais interna para que eu não possa mais enxergar o que me cerca. O brilho das cores é tão forte que assim serei obrigado a me manter de olhos fechados para o meu Ser e meus olhos se arderão a qualquer tentativa de espiar. Ainda faltam muitas paredes.

7 de out. de 2010

e o pingo que não pinga e que molha sem querer

passo rápido,
céu nublado,
pingos dispersos:
multidão que esbarra.

passo automático,
céu que desaba,
pingos grossos:
multidão que foge.

passo lento,
céu claro,
pingos ausentes:
multidão indiferente.

passo torto,
céu invisível,
pingos internos:
multidão que se transforma.

passo por ti,
céu que se abre,
pinga sobre mim:
multidão transfigurada.

2 de out. de 2010

Um temperamento que quisera

Apoiava as paredes com suas costas arqueadas e as marcava com as solas gastas de seu único par de sapatos. Era um bibelô em meio as pessoas. Não pertencia a toda aquele alvoroço que era viver. Respondia com meias palavras e não demonstrava empolgação sobre coisa alguma. Nasceu enrugado e nunca tentara evitar. Tinha gomos nos cabelos e sua camisa branca anda sempre amarrotada. Era proposta companhia, ele negava sem fitar qualquer pessoa nos olhos. Conhecia profundamente todas as marcas e vincos no chão do lugar. Nunca buscou ser aquelas pessoas que faziam sua festa particular. Apenas não queria sair de sua dor de particular. Nascera morto e não reviveria jamais.

23 de ago. de 2010

Sobre o alvo pendurado no seu peito aberto

Sentira seu peito apunhalado mais uma vez.
O sangue escorrera em um filete interminável, uma hemorragia lenta e eterna.
Fizera grande esforço para impedir suas pálpebras se fecharem.
Sentira as pernas amolecerem e desistira de tentar levantar os braços para arrancar a flecha que o ferira.
Da sua cabeça eram arrancados cabelos com apenas um leve sopro de brisa.
Sentira seu peito apunhalado mais uma vez.
Esquecera automaticamente se havia feito qualquer movimento que demonstrasse não querer se ferir.
Não quisera impedir.
Seu sexo adormecera juntamente com sua força para proferir palavras.
O acaso aplicara a ele mais uma armadilha fatal.
Ele desmaiara em um recanto que jamais teve ao seu alcance com um sorriso que demostrava o ápice do seu encontro consigo mesmo, o auge de sua dor e uma certeza que nunca tivera anteriormente.

11 de ago. de 2010

Sobre música de tom

Era ritmada em bossa nova. Ele sofria de uma dor incontrolável. Dor como uma enxaqueca incurável. Não ligava. Ela carregava uma dor no seu olhar grande e profundo. Ele ansiava por dividir e aliviar seu pesar. Era impossível. Dissimulava por não saber evitar. Buscava respostas que não encontrava, por mais que insistissem em saltar aos olhos. Ele não sabia se poderia acreditar. Coloria seus dias de uma forma doce e ele não sabia mais o que esperar. Deprimia-se ao chegar da madrugada e recordava de noites regadas por cafés e cigarros excessivos. Tais como palavras bonitas e empatias. Cafés sem açúcar e olhos doces. Deixava tarefas de lado por não conseguir se concentrar. A via em suas leituras de forma tão evidente e faltava coragem para dividir. Imaginava onde estaria e sonhava com lençois soltos e desarrumados pela cama grande. Imaginava sentimentos e apegos que poderiam não existir. Procurava doses de cores muitas vezes por dia. Entregava-se de uma forma que pensara não ser mais possível e sorria bobo com tudo. Dividia dores que jamais havia conseguido com outro alguém. Dores profundas no seu âmago que não evitava. Dividia de forma clara sem precisar falar literalmente. Sentia empatia. Dizia dissimular, mas se jogava de forma tão evidente dando de ombros para sua impotência. Repetia frases já escritas só pra ver se compartilhavam os sentidos. Ela o repetia e ele se via de cabeçaparabaixo.

9 de ago. de 2010

De cambalhotas que não esperava virar

Novamente se deparou consigo mesmo vendo o mundo de cabeça para baixo. Fumava compulsivamente e sorria amarelo como quem tenta disfarçar sua dor com bom humor. Não agia naturalmente e media todas as palavras a serem ditas. Encontrava velhos medos que havia escondido em lugares quase inacessíveis.

Aventurava-se em sua tentativa de ter a atenção para si e quando esta era dada não sabia o que fazer. Queria tocar sua mão suada e ver seus grandes olhos escuros e redondos fechados. Queria sentir seu corpo branco e distante para ela, queria a ver entregue em seu colo e apego, mas sabia ser impossível. Lembrava da canção que dizia “me encontrou tão desarmada que arranhou meu coração” e sentia lâminas cortando partes que tentava impedir de serem expostas. Ele a olhava agindo de forma tão natural e espontânea que se encantava ainda mais pela sua facilidade de ser terna sem usar palavras. Não a fitava nos olhos, pois sentia pavor de sua olhada grande e profunda que para ela parecia tão fácil de dirigir quando convinha.

Dava tiros tentando impressionar e se mostrava disposto a todas as atrações. Ria dos brinquedos medíocres disfarçando a sua própria insegurança e ansiedade. Trocavam frases curtas e ele não sabia como agir quando ela sentava do seu lado em meio a grades e cintos de segurança. Admirava quando ela olhava nos seus olhos tão profundamente e dizia qualquer frase banal. Deparava-se observando ela girar em meio a luzes, músicas desagradáveis, pessoas desconhecidas e nos seus pensamentos e desejos. Imaginava trocas de olhares e ansiava por sentir seu cheiro e seu calor.

Via o mundo ao contrário pela janela do Kamikaze. Sentia a sensação de ter os órgãos internos espalhados pelo corpo em lugares que não eram devidos. Em meio a tonturas, enjôos, adrenalinas, cocas-colas e brinquedos repetidos, sentiu pequenos pulsares no fundo de seu peito como há algum tempo deixara de sentir. O parque de diversões reanimava seu coração perdido.

23 de jul. de 2010

Os sonhos que impediam de deixar de lado o cheiro que tanto gostava

Sem contar a ninguém, saía para caminhar por lugares já conhecidos sem rumo algum e objetivo previamente decidido. Aprendera a colocar sua dor e frustração nas caminhadas em círculos mesmo sabendo que nada mudaria. Sonhava com imagens confusas, com paixões abandonadas por motivos desconhecidos e saudades guardadas no fundo da gaveta para não doerem mais. Ansiava pelo apego de outrora, o corpo como flor e o cheiro como calor que sufocavam de uma forma que ainda permitiam respirar em instantes necessários. Se enrolava no meio da sua confusão sem querer ouvir nem descobrir nenhuma explicação óbvia ou necessária, apenas transformar um novelo em cachecol de colocar bem apertado no pescoço cheiroso e livrar do frio e de dores que incomodam para engolir.

15 de jul. de 2010

Piadas cansadas, gozos suprimidos e histórias invertidas

E acabava por sacrilégios e desencontros premeditados. Brincava que a distância era pouca, mas afastava. Pensava que a cama salvaria, mas não sabia. A piada? Perdeu a graça.

De vez em quando ainda sonhava com aquele dia em que tu me trouxe tanto lirismo, melancolia e trocamos pessimismos. Me diziam para esquecer. E eu fingia que sonhos eram tolices. Dissimulava a tal ponto que fizeste, da minha representação, verdade.

Mentia para mim mesmo ser mais um blablabla típico de encontros de velhos amigos. Guardava o meu encanto e buscava banalidades. Te procurava em outros copos, outras camas. Eu ria do que tu falava, mas não escutava. Tu gesticulava e idealizava o mundo. Eu achava tão bobo. Eu achava tão bonito.

Sempre te prometia visitas e tu dizia que me esperaria na rodoviária. Perdia o ônibus e o próximo, eu imaginava, que nunca viria. De uma viagem inesperada, domingo ensolarado e conversas prorrogadas, tu me esperava com um livro qualquer nos braços. Não me importava.
Olhos de diamante e eu disfarçava o encanto.

Ríamos e dizíamos que nosso encontro seria na cama. Eu sabia que não fazia teu tipo, mas não deixaria de ilusionar. Perdíamos horas à distância aumentando egos e esnobismos típicos de primeiras conversas. Ilusionávamos planos e fazíamos grandes piadas de tudo.

13 de jul. de 2010

De cismas esnobes e comodismos

Certa vez me dissera “se eu tivesse uma irmã gêmea, me envolveria com ela certamente.” Um comentário nada atípico da sua parte e do padrão que ela sabia me enojar. Eu notava que sempre lhe faltava certa prolixidade em fazer esses comentários descabidos. Escutava-os como um tapa na face do tipo que deixava marcas de dedos por um tempo longo. Ela insistia em repetir concomitantemente a suas atitudes desagradáveis de fazer gestos e caras que me repugnavam. Ficava estático e desconversava na falta de audácia para retribuir-lhe a altura.

À primeira vista, admirava toda aquela sua liberdade em encurtar caminhos para tocar em assuntos que eu deixava de lado e para mostrar o seu lado sagaz no que tangia a falar de si mesma. Nunca me pareceu esnobe e nem austera, entretanto tinha uma implicância e um narcisismo peculiares que ansiava por explicitar. Eu fingia ignorar, mas ela me jogava às vistas.

Da forma costumeira em relações prolongadas, os detalhes pareciam tomar proporções gigantescas como se ciscos se tornassem cegueiras e hematomas, coágulos. Ela sentia meu pesar e se mostrava apática para me intrigar de forma ainda maior. Eu seguia impotente sem a mínima capacidade e possibilidade de defesa.

Eu a desejava ardorosamente, sabia. Aqueles minutos sobre o seu corpo me convenciam que poderia relativizar toda a intolerância com seu sarcasmo apurado e elegância fingida. Sentia o seu cheiro arder sob meu corpo e lhe arrancava suspiros insaciáveis na sua mais uma tentativa de se sobrepor. Nessas vezes, inutilmente. Acendia um cigarro e ria das suas reclamações pelas marcas deixadas e cabelos arrancados. Altivo, escondia o regozijo suprido e ignorava suas pirraças.

1 de jul. de 2010

Por não entender de Jogo da vida

A roleta girava e ele fingia que sua peça no tabuleiro não se movia. Sabia que corria riscos, mas não quis deixar de jogar. Ela propunha um jogo no qual não se objetivava vencer e, menos ainda, alcançar o final do tabuleiro. Ele não conseguia se iludir dessa forma, entretanto não queria mover sua peça. Ela girava e girava a roleta e fingia que não se importava com os movimentos. Ele estava ressentido e frágil e com medo de chegar no Payday e ter que prestar contas. Tentava jogar despretenciosamente, mas a peça dela cada vez se aproximava mais de uma forma tão inevitável. Pediu para andar alguns movimentos para trás, mas já não era mais possível. Só ela podia quebrar as regras e ele observa estático e impotente.
Decidido a deixar o jogo continuar, ele girou a roleta. Embaralhava os números sorteados e movia sua peça mais do que deveria. Ela o colocava no lugar devido novamente. Ele se perdeu e o dia do pagamento chegou: não sabia quanto deveria receber, tampouco quanto faltava, entretanto sentia vontade de depositar todas suas notas no tabuleiro e acabava por perder o controle do jogo. Comprou um carro e deixou um lugar vago. Vagava vago. Espaço Vago. Vago vago.

28 de jun. de 2010

Corredores compridos com finais curtos

Mais um dia que atravessava os mesmos dois lances de escadas daquele corredor branco vazio com paredes já não mais tão brancas, cheiro de desinfetante e luzes fracas. Era o pior momento de seu dia: a chegada na repartição. Todos se movimentavam e falavam ao mesmo tempo e sua cabeça todos os dias estava prestes a explodir. Se sentia um ponto preto, mas não tão preto, minúsculo e quase inexistente em meio a aquelas mesas, paredes e chãos brancos não tão brancos. Se distraía com sua imaginação e se concentrava com o seu estar a parte e já não sabia mais no que pensar. Repetia frases feitas para amigos e já não tinha paciência de inventar sentimentos e emoções. No seu interior apático não ansiava por aventuras e tempestades, apenas por sossego: pensava ser essa a solução para seu fingimento de dor e a sua constante insatisfação.
Na chegada do trabalho andava pelo corredor que começava seu apartamento e parecia que ele jamais acabaria e nunca encontraria nada. Descontava sua solidão em cartelas de dorflex e sentia as costas doídas sempre que deitava. Ansiava por um café, mas nunca queria afastar aquela sensação de cansaço. A dor de cabeça seguia constantemente.
Tentava fugir dos finais de semana. Sem trabalho e faculdade a vida era mansa, mas era só. Ela dizia gostar de ser só, mas fazia parte do seu papel representado. Se afundava nos travesseiros e edredons infantis e fingia não ligar. Ouvia seu interfone tocar e apenas se virava na cama. "Era engano", pensava ela.
Em final de semana chuvoso e frio, buscou tentativas para se livrar do medo, que doía mais que a solidão. Tentou jogar partidas de sinuca, mas as bolas nunca caíam na caçapa. Revirava o bar por diversas vezes atrás de uma companhia qualquer. Era bonita, era notada, mas sempre estava só.
Saiu correndo e se atirou nas gotas que já caiam grossas. Não se importou em borrar a maquiagem, nem em seu penteado desfeito. Ao chegar em casa sentiu as orelhas queimarem e lembrou de ditados sexagenários. Passou um café na sua cafeteira verde, acendeu um cigarro e caiu no sono em sua sacada.

21 de jun. de 2010

de passadas curtas e olhares longos

e ouvia despretenciosamente enquanto tentava acelerar as passadas. me pedia para escutar, mas ao voltar minha atenção já não falaria mais. eu lembrava de apegos e desapegos, noites mal-dormidas, pensamentos vagos e discordância trocadas. o frio me cortava por fora, a incerteza por dentro. me dizia que não entendia, que eram opostos. lembrava da canção que dizia que 'os opostos de distraem e os dispostos se atraem'. andava disposto, mas andava com medo. o sorriso havia voltado, mas girava tantos outras confusões no meio de poucas certezas. dessa forma me impedia e via o teu auto-impedimento idem. andava desgastado e sem deixar a empolgação me tomar. lições de vivência. e tu me falava tudo e eu me impedia de chorar. mantinha a pose. fingia uma certeza inexistente e saberia que a falta estava por vir. não sabia o que fazer de mim e não soube o que fazer de ti. fui teu.

14 de jun. de 2010

O passar dos anos e a maturidade sentimental da preferência nacional

Não entendo o motivo que convencionamos a chamar de experientes as pessoas mais velhas. Obviamente, se formos considerar o fato de terem vivido maior quantidade de situações adversas o adjetivo pode ser até bem aplicado, mas ao considerar experiência como sinônimo de maturidade essa expressão deixa muito a desejar. Principalmente se tratando de sentimentos. Ando cansado de falar de mim mesmo - que são os únicos sentimentos de homem que entendo. Então tratarei das mulheres.
Algo que sempre pensei durante a adolescência era que mulheres balzaquianas (trintonas) eram bem resolvidas, sabiam o que queriam, tinham a vida encaminha, ou seja, todas aquelas coisas que os nossos pais nos dizem que temos que ter resolvido ao chegar aos 30. Iludia-me com esse pensamento e sempre admirava as ditas trintonas. Pensava eu: "Nossa, além de ter uma baita estrada na cama, elas sabem o que querem. Já chegam por cima." Claro que algumas delas realmente são assim, mas normalmente essas se deram bem (financeiramente falando) ou são casadas. Tratando de mulheres solteiras, a idade é inversamente proporcional à maturidade sentimental.
Com o passar do tempo comecei a me envolver com as diversas faixas etárias de mulheres ainda me iludindo que a ideal só poderia ser balzaquiana ou quase lá. Toda aquela experiência e a individualidade seriam um sonho. Claro que o corpo já estava começando a declinar, mas isso não é tudo e muitas ainda não chegaram nessa fase. Balde de água fria e choque de realidade.
As mulheres de vinte anos ainda não tem experiência em relacionamentos, tiveram, no máximo, um ou dois namorados, não sofreram grandes desilusões, nunca foram pedidas em casamento, e o corpo estava no ápice de toda a vida. Com isso se tornam independentes, ainda conseguem dar risadas com os problemas, não criam expectativas gigantescas, se contentam com a companhia das amigas, ainda conseguem levar relacionamentos sem ansiarem loucamente por um casamento ou por algo que o valha. Ou seja, ainda existe muita vida pela frente e, assim, ainda conseguem levar a vida de forma leve e os relacionamentos idem. Não aceitam traições. Existem mil possibilidade e então não há porque passar por isso. São seguras de si.
A vida corre e passam a se decepcionar, já sofreram o bastante pra não confiar à primeira vista, mas por outro lado a carência vai aumentando. Não se encantam tão facilmente como no início da vida adulta, os olhos não brilham mais tão facilmente, a energia para paixões já não é a mesma, mas ao se apegarem a armadilha está armada. As amigas que outrora estavam sempre do lado aparecem casadas ou grávidas e, assim, o desespero só vai aumentando. A necessidade de ter alguém do lado da mesma forma e a paciência para aguentar problemas diminui, mas mesmo assim a paciência de aguentar o tempo sozinhas também é menor. Aceitam traições, defeitos e justificam isso como sendo seguras de si, mas não aceitam ouvir que já não existem tantas possibilidades e não tem mais vontade, paciência, disposição de começarem de novo.
Não faço apologia às novinhas e, muito menos, diminuo as balzaquianas, mas, claramente, notei que todas as minhas expectativas de experiência sexual e sentimental não andam juntas considerando a vida das mulheres. A solução do problema? Não faço a menor idéia. Dai-me paciência, Senhor!

13 de jun. de 2010

As mulheres da minha vida

MD me ensinou a tornar a própria vida textos literários. Tristes, realistas e carregados de emoção, como a vida deve ser. Descrever fatos de nada adiantaria. O interno acaba corrompendo todas as barreiras de apatia e dureza de coração. A cada novo soco, uma nova dor; a cada dor, uma nova pessoa. Lágrimas são pouco. É de cortar.

CL me mostrou que atos não são nada diante de sentimentalismos em literatura. Banalidades são o objeto-mor desta arte. Até baratas podem compor romances. O trágico se torna cômico e a leitura dá um frio na barriga e uma impressão de se estar ficando transtornado. A paixão faz o mesmo. CL me mostrou que a literatura é como a paixão.

Com a Ana C. não aprendi a viver, aprendi a escrever. Soube que em literatura não precisa de personagens, cenários, diálogos imaginários quando se vive. Passei a para de reclamar da minha vida, mas comecei a me lamentar. Não sou católico e não acredito em confissão, mas, por outro lado, acabei fazendo do papel o meu confessionário e da pena a minha penitência.

OD me falou de forma simples, mas terna. A poesia trazia o sorriso por vezes e a lágrima em outras. Não a abandonaria jamais.

Dentre todas as mulheres da minha vida, devo dar maior importância a HH. Com ela não chorei, não me lamentei, não aprendi a escrever. Dela eu apanhei. Ela me dizia tanta coisa que eu já não sabia se conseguia compreender, em frases sucintas me mostrava coisas tão evidentes que eu não enxergava. Tentei plagiá-la: não consegui. Ficava por dias sem comer e me afundava no copo toda vez que eu a encontrava. Já não me importava mais com meus quilos a menos e nem com o alcoolismo. Precisava desse fulgor que me incendeia em todas as vezes que eu a encontro.

O que o sábado que parece domingo acaba trazendo.

Insistia em escrever sobre coisas que já não fariam o menor sentido. O tempo andava estagnado: não sabia o que fazer. Narrava as coisas que me aconteciam e sempre dizia para que se cuidasse. Queria pedir que me cuidasse. Faltava coragem. Ela sabia o fazer, eu tinha esquecido. Lembrava de tempos não remotos em que se preocupava consigo mesmo. Hoje já não dava importância. E contava as história que o cercavam, mas acabava falando de si mesmo de forma indireta e pretenciosa. Ele sabia que ela não gostava de ouvir, mas não conseguia se calar. Ela só concordava e fingia que nem notava suas lamentações.
O frio cercava e ele não queria se levantar. Recebia propostas que não tinha a mínima paciência de cumprir, mas o tédio impedia de negar. Formulava desculpas retóricas que não sabe se adiantariam. Não levantava para escovar os dentes. O cuidado era menor e a falta de vontade de qualquer coisa só aumentava. A gêngiva sangrava e ele prometia para si mesmo fazer algo. As leituras ficavam pela metade e o dia passava devagar. Tinha pressa, mas o tempo não era seu amigo.
Pensava em coisas que já o desinteressavam. Pedia ajuda para a literatura, mas ela dizia que não conseguiria viver por ele. A garrafa dizia o mesmo e fazia a cabeça doer no outro dia, a beleza desarrumava a cama e não colocava a mesa.
Chorava, mas não sabia os motivos. Deixava os soluços que se apossarem. Eles vinham de tempos em tempos.
Sentou num banco de uma praça qualquer, a grama molhada impossibilitava de sentar no chão. Lembrava de história da noite anterior e via que nada mudava. Percebeu que as linhas andavam tortas. Sua escrita andava torta e não senti a mínima necessidade de mudar.
Ao chegar em casa tomou um café sem açúcar. Não impediu que o amargo se apossasse do resto de seu corpo. Assim ficou.

9 de jun. de 2010

Do peito côncavo e migalhas que devoraria

E eu gritava por não saber mais esperar. Tantas palavras, gestos, olhares e gozos trocados para ter o silêncio em retribuição. Buscava frases feitas para expressar a ausência. Clarice me explicava: retrato de um côncavo. Abria meu peito côncavo, mas as muralhas rapidamente se fechavam e ele seguia com seu vazio. Chineses me entenderiam. Muralhas instransponíveis cercavam de todo a região que um dia palpitou. Tentava plantar algumas sementes, mas flores jamais crescem em poços. A água já havia secado e a luz do sol já não alcançaria a terra ao fundo. O copo esvaziava, o maço de cigarros chegava ao fim, eu seguia no meu dilema e não saberia suportar. Ouvia promessas que não seriam cumpridas. Não daria mais atenção. Mentia pra mim mesmo. Lia as frases já esquecidas, abria os velhos livros e encontrava pétalas sem cores. Me sentia tonto e com náuseas: vomitaria todas as frases que haviam guardadas em uma carta que jamais enviaria. Me faltaria coragem para encarar a realidade. Elaboraria um diálogo se as palavras não me cortassem como cacos de vidro ao serem proferidas. Procurava o fundo do teu olhar, encontrava o auge da minha dor. Escrevia para esquecer, mas o fazria inutilmente.

19 de mai. de 2010

O milagre da poesia

Fato: Em uma típica noitada qualquer, encontrei uma menina sentada no bar. Ela parecia entendiada. Me disse algumas coisas e eu achei engraçado. Convidei pra tomar uma cerveja e contei de minhas típicas frustrações. Não eram tão grandes. Ela fingia me compreender. Era bonita. Foi uma boa companhia.

Poética: Noite enluarada e céu estrelado. Típica noite de não se esperar nada, mas acreditar no milagre do coração. A paisagem não deixava por menos. Andava cabisbaixo como os poetas haviam ensinado. Moça de olhos brilhantes e um sorriso disfarçado no canto da boca. Era tédio e recolhimento do coração. Não deixaria de notar. Me contou de suas aventuras, desventuras e venturas. Eu ria e meus olhos passariam a brilhar. Dividíamos melancolias e acreditávamos que os poetas nos salvariam. Tentava prorrogar de todas as formas o momento. Passara a me sentir bem. Eu falava tanto e de uma forma tão despretenciosa. Ela me consolava com seu olhar. Olhos de uma cor que nunca soubera definir. Notava como ela mexia no cabelo e se entregava de uma forma muito reservada. Madeixas crespas. Sorriso bonito. Ternura que eu nunca ousara imaginar. Foram poucos minutos. Eu sonharia diferente.

Sempre pensei que poesia era atribuir significado a pequenos gestos.
Confundia poesia com sentimentos.
Linha tênue?

10 de mai. de 2010

O materialismo sentimental de Marx e a dialética

Tese: Amor
Antítese: Ciúmes
Síntese: Sofrimento

A dialética por muitos anos foi a metodologia em que o materialismo histórico se baseava. Pura falsidade. Duvido que Marx tenha chegado as suas conclusões dialéticas analisando a sociedade capitalista em que se inseria e assim formulado o pensamento socialista. Sabemos todos que Marx era mais um bebum no meio de tantos outros rejeitados pelo seu objeto de desejo.
Marx gostava da sua coleguinha de filosofia. Formulava mil pensamentos vãos e tentava roubar seu coração citando Aristóteles, Platão e até Hegel - que era mais complicado de entender. Ela achava aquilo engraçado, mas morria de paixões pelo melhor amigo de Marx, Engels. Engels era destemido, radical e não era tão idealista. Dizia as coisas na lata, como deveriam ser ditas. Não era um sujeito de muita enrolação. Sabia o que queria.
Marx conheceu o amor. Soube das sensações de amar, das dores de amar, da leveza de amar. Marx conheceu o ciúmes. Sabia que sua colega se daria melhor com Engels, mas a queria para si. Não compreendia como, ao mesmo tempo que a amava, queria que ela fosse sua, mesmo sabendo não ser o melhor. Sua colega dizia que achava Marx engraçado, mas só poderia escolher um amante para si.
Revisitou a obra de Hegel e viu que este havia passado por frustrações semelhantes. Hegel havia se apaixonado por uma fulana de classe superior a sua. Esta era esnobe e não o quis, mas era encantadora. Hegel chamou de dialética seu amor e rejeição.
Por ter ciúmes, Marx acabou pensando em uma solução para o seu problema. Iria elaborar uma teoria em que sua coleguinha pudesse ter Engels e Marx ao mesmo tempo. Ele não a teria apenas para si, mas a teria. Seria uma relação dialética. Mas pensou mais e viu que não deveria ter posse, não precisava de propriedade. Todos deveriam ser amados por ela e amar ela. Esse processo se chamaria de "ditadura dos amados", no qual aqueles que compartilhavam a visão capitalista de querer somente para si o seu objeto de amor, entrariam em conflito com a maioria e seriam vistos como inimigos até chegarmos em uma relação que se chamaria de comunismo, no qual todos podem ter todas e vice-versa. Tentaram aplicar em um grande país frio localizado parte na Europa e parte na Ásia, onde todos precisavam de cobertores para suas orelhas, não funcionou. Numa ilha americana quente, localizada nas proximidades da linha do Equador também foi aplicada, mas a teoria não se cumpriu e apenas alguns tiveram posses de todas as mulheres por serem os barbudinhos de boina mais bonitos.
A aristocracia da época de Marx descontente com esse pensamento roubou seus manuscritos e alteraram todos os trechos que falavam sobre amor para capital. Inventaram uma nova classe para ocupar as teorias de Marx, o proletariado.
Assim surge a teoria de materialismo de Marx.
Entretanto o pensamento entra pra história na forma de dialética. O amor sempre acaba por se contradizer no ciúmes ou na rejeição. Dessa forma, acabamos por gostar de amar mesmo causando sofrimento, mas é um sofrimento que não queremos nos livrar e assim acabamos por cair numa relação dialética. Se o ciúmes entrar na história, fica ainda pior. Tendências psicopatas? Aí mesmo pode-se entender a tal da dialética.
Marx sofreu de amor e acabou por cair no alcoolismo e ter um caso com Engels que o sustentou e o convenceu a abandonar seu amor filosófico. Dá pra entender.

4 de mai. de 2010

por não entender de feeds.

ele testava mil vezes a tal da nova tecnologia.
busca de divulgação, elogios ou algo que o valha.
tentou os feeds.
eternansiedade não conseguia esperar.
sempre foi moderninho e entendeu dessas coisas,
mas a literatura pulou na frente e ele ficou tão desinteressado.
funcionou?

Imaginário revelativo absoluto eterno esquecido relembrado fictício realizado

Ele: - Eu já tive medo do escuro.
Ela: - Eu não sei andar de bicicleta.
Ele: - Tem vezes que quando já deitei e esqueci de escovar os dentes, eu durmo sem escovar.
Ela: - Matei o banho domingo passado.
Ele: - Cheirei o travesseiro no dia seguinte da tua primeira vida aqui.
Ela: - Cheirei minhas mão aquele domingo inteiro.
Ele: - Te comprei um presente, mas fiquei com vergonha de dar.
Ela: - Te escrevi uma carta cheia de frases de impacto.
Ele: - Elaboro coisas bonitas pra te dizer, mas às vezes dá um branco e falo só besteira.
Ela: - Chorei de saudade naquela despedida, mas fingi que foi o filme que passou no ônibus.
Ele: - Senti tua falta e doeu.
Ela: - Sonhei que acordava do teu lado, te liguei, mas desliguei antes de atender.
ad infinitum.

25 de abr. de 2010

do moço de chapeu e da moça que não podia prender o cabelo

o pensamento andava distante e assim tropeçava em pedras que pareciam tão evidentes.
a lua não aparecia mais em sua janela. dias cinzas e nuvens carregadas.
esquecia a chaleira de água fervendo no fogo por várias vezes.
a cada domingo uma nova gripe pra não levantar.
regava sementes de flores que não sabia o nome.
esquecia que o outono as impedia de nascer.
inventava histórias que percebia que eram só suas.
saía de chapeu porque não gostava da barba molhada.
se enrolava no cachecol com medo do frio.
lembrava de ternuras e tricoteava juntando os pedaços.
dos dias já haviam passado mais de 60, mas ele não acabara o filme.
queria pintar de vinho a colcha branca e pintar de branco o seu coração.
sempre ouvia que deveria ser cuidadoso e não chegar muito perto com a sua taça e nem derramar todo seu carinho.
"fica bem" era sempre repetido.
leve.

22 de abr. de 2010

sobre o pacu que viveu no mar

menino que não tinha nome ganhou um livro de uma sereia, quis conhecer o mar, foi ver o circo e foi batizado com nome de peixe de água doce. menino pacu sabia duas histórias, mas quando contava uma, esquecia outra. menino pacu não era feliz, mas contava histórias. um dia seu irmão voou e fingiu de morto. todos riram pela primeira vez. seu irmão tonho tinha 20 anos. conheceu o amor. a lua cheia acabava com a trégua da faixa preta. menino pacu conhecia a ternura. a ternura que era maior que o amor. menino pacu queria conhecer o mar. menino usava chapeu e a faixa preta enquanto caminhava entre o canavial. ele lembrava da sua história, mas esquecera a da sereia. a sua história estava por acabar e então voltara a lembrar a da sereia. o trovão que não vinha do ceu estalou.

"um dia a sereia veio buscar o menino pra viver mais ela. ele gostô. ela virô o menino em peixe e levô ele pra viver debaixo do mar. no mar ninguém morria e tinha lugar pra todo mundo. no mar eles vivam tão feliz, mas tão feliz que não conseguia mais parar de dar risada."

11 de abr. de 2010

do gosto da boca doce e da dúvida

ele não cansava de seu novo encosto em formato de ombro. trocavam carícias, abraços, palavras bonitas e ela sempre dizia que ele era "doce, tão doce". gostava de estar ali. seu cabelo era sempre despenteado por todas as carícias que ela fazia. ele não queria levantar. ela repetia que ele era "doce, tão doce". com muita curiosidade ele a fitou nos olhos e perguntou:
-que doce, moça bonita?
ela não entendeu a pergunta.
-tu me prova e sente meu gosto. eu não canso da tua boca, mas me diz, que sabor tenho eu?
ela não soube responder. eram meras frases repetidas.
ele sabia que ela era um doce de amendoim daqueles que ela detestava, mas pra ele não existia melhor.

7 de abr. de 2010

trapaças, habilidades e sortes que não fariam diferença

"Provavelmente o amor é um jogo; nos jogos é preciso respeitar as regras. Em todo o caso, é alguma coisa muito delicada: não o manuseie, como eu o tenho manuseado, porque o estraagará irremediavelmente."
Adolfo Bioy Casares

Pensava que sua trinca de damas seriam suficientes. Percebia o blefe com pequenos sinais: o olho esquerdo tremia vagarosamente enquanto a mão oposta suava. O amor não poderia ser poker, já que os blefes nunca são percebidos. As cartas na manga, no amor, eram inúteis.

Fazia apostas nos pares, impares, vermelhos e negros. A roleta girava e o 0 dava o prêmio pra banca. O amor não seria a roleta, já que nesta quanto mais números apostamos, maiores as chances de êxito, mas com prêmios menores. No amor só se podem colocar todas as fichas em apenas um número esperando a sorte grande. Ao tentar apostar metade das fichas ou em vários números a banca sempre vence.

A primeira carta era um três, depois veio um nove. Doze. Seguiu apostando. Seguido por um sete. Dezenove não seria uma pontuação ruim, mas poderia esperar o dois. Exitou. Blackjack não é o jogo do amor. No amor apostamos tudo sempre, independente de estar quase no vinteeum.

Tinha uma vantagem de três bolas. Uma nova tacada e a bola oito, à beira da caçapa, cairia. Com cálculos de distâncias, força, velocidade do vento, um passar de giz na ponta do taco; foi dada a tacada final e a bola oito seguia imóvel. O desfecho do jogo nunca se soube. O bilhar jamais se assemelharia ao amor. Anos de treinamento na arte de amar e o jovem senhor me disse em certa feita que não sabia nada sobre essa arte. Nunca conheci um amante habilidoso, diferentemente dos jogadores de bilhar.

Depois de tirar dezessete vezes o mesmo número, desistiu de girar os dados. Nunca souberam me dizer se o dado era viciado ou se aquele era seu dia de sorte. O amor não é um jogo de dados. Nunca conheci amor viciado e nunca pude contar com a sorte no tal jogo que chamam de amor.

Nos últimos dezessete anos apostou em apenas dois cavalos, dois pampas muito semelhantes. Depois de catorze anos de corridas a sua primeira opção de apostas morre e ele não hesita em seguir no seu herdeiro. A mulher pede que deixe os cavalos de lado. Perdeu a formatura de seu filho porque as chances do seu pampa ganharem eram grandes. Nunca ganhou um tostão, mas contava as horas pela próxima largada. Considerando lucros e dividendos o amor não existe. Na hora da escolha, o olho nunca se engana, não analisa o passado, não pensa na resistência e no porte físico, mas aposta todas as forças no cavalo de sempre. Nunca ouvi caso de enriquecimento em corridas de cavalos. Nunca ouvi história de existir um ex-apostador de corridas de cavalos. Penso que o coração se assemelha ao jockey club. As apostas são incondicionais e irracionais. Não existem ex-amantes. Pode passar a pessoa amada, mas depositamos toda a confiança no próximonovoamor. Anos de desilusões e o coração palpita novamente quando surge um novo "cavalo" na pista cinco.

14 de mar. de 2010

segredo de seus olhos

e a vida girava em linhas tortas, como dizia a canção.
mentia pra mim mesmo que era apenas a cabeça que doía.
disse que andava entediado: mentiras premeditas.
não levantava da cama e sonhava todo o tempo.
andava sempre com fome.
queria ter uma floreira pela casa.
precisava de algo para aguar.
se perdia entre paradas de ônibus e falava o que não devia.
começava filmes e leituras que deixava para trás.
sempre gostara de diversões solitárias,
mas não gostava mais de se sentir só.

1 de mar. de 2010

da volta de silêncios pelo sol e pela lua

desisti do literato,
labuta mais sem cabimento.
com todo esse meu sorriso
não quero a dor como fermento.

versinhos mais desnecessários
aproveito olhares indefinidos
guardo a poesia nos armários
para épocas de frio.

desperdício de metáforas?
as tiro do papel.
não preciso de palavras
tenho visto a lua no céu.

sofrimento demais se chamava amor.
então de que me servia,
se sempre eu o aliava a dor?
ganhei apertos a reviria.

perdi a aposta da graminha.
não fiz meu pedido.
mas já tenho toda a ternurinha
que há tempos tenho desejado.

19 de fev. de 2010

metalinguística

para escrever um poema,
pensava sobre o maldito tema
que o tornaria uma obra ímpar.

sempre tentei falar de amor
que nunca consegui não aliar a dor,
mas, dessa forma, esse era sempre tratado.

outrora falava de mim,
das minhas frustrações em encontrar um fim
acabei me cansando.

banalidades já foram ditas,
por vezes até escritas,
mas sempre me impressionaram.

busquei inspiração no bandeira,
de minha autoria só saiu asneira
e eu seguia no meu impasse.

recorri aos poetas estrangeiros,
não consegui nem alcançar seus cheiros
quem dirá poetizar.

acabei me recostando no travesseiro
o sono me alcançou ligeiro
e a pena ficou de lado.

8 de fev. de 2010

em dias de chuva e sol

e não é que com o final da tarde veio o sol? uma pontinha de sol.
andava em um tempo de não entender metafóras sendo que era o que mais procurava.
andava nervoso, um pouco ansioso. pensava mil vezes antes de escrever algo e mesmo assim não conseguia passar o que sentia.
a chuva veio dessa lado, do outro também.
o calor foi embora, mas o que ele buscava era o calor.
o calor do sol andava demasiado, mas certa noite sentiu o calor da lua.
procurava fios de cabelos pelo lençol branco.
mas de que me adianta o sol bater na minha janela e formar um arco-íris se a lua não me aparece pela noite?
hoje entendi o que o tom chamava de "inútil paisagem."

7 de fev. de 2010

ele se impediu de escrever o que tinha ganas, como dizem os argentinos.

sobre tropicalias e dias ensolarados

era um tempo de mudanças, ele sabia.
viu que não eram frios os quarentaetantos graus santamarienses.
tinha vergonha de suas costas molhadas e de sua estatura.
vezenquando tinha um pouco de orgulho de algumas coisas.
ele olhou para o prédio moderninho enquanto caminhava pela rua.
na primeira noite só deixou a timidez de lado tardiamente.
na posterior ele a esqueceu em casa.
passava bons momentos entre amigos. andava precisando.
ausentou-se na busca de um belo sorriso e olhos de cores que ele não conseguia definir.
tentava manter a postura. muitas vezes não conseguia.
comprou uma garrafa de água. fórmula do auto-controle em meio a noitadas.
fez um dia bonito e ele pode ver o sol se levantando.
disse que gostava de dias ensolarados. ela riu.
ele matutava sobre entregas e possibilidades.

4 de fev. de 2010

fragmentos de sapos viciados em cafés

meu passado me condenava,
entre mistérios e esperanças se escondia.
meu futuro é duvidoso,
não tenho grana, mas tenho dor.
desistiu da terapia.
não gostava das boletas e andava cansado de falar de si mesmo.
aparentava ser um sapo.
sabia que escondia por debaixo do seu manto a si mesmo.
numa esquina qualquer encontrou uma máquina de café.
duplo e sem açúcar.
não gostava de açúcar, precisava de um equilíbrio entre seu grude renegado e o café amargo.
pensou melhor e resolveu fazer um novo pedido
apalpou os bolsos mas sua última moeda havia caido no bueiro.
ele deu de ombros e se foi.

29 de jan. de 2010

através da fronteira

olhava timidamente por cima do muro.
ví que usava uma faixa vermelha no cabelo.
achei bonita.

-------------------------------------------------------------------------

conversava na praia sobre rock and roll, filmes e literaturas.
cabelos curtos, vestido branco e uma blusa verde.
o sorriso mais bonito que já ví.
ela dizia que era grande demais.
disse que era melhor do que não ter.
ando cansado da seriedade.

--------------------------------------------------------------------------

"es mi vecino" ela me disse.
não entendi. ela repetia.
"tu casa es do lado de mi casa"
lembrei que sempre espiava.
não pude mais sair da frente da casa.
esperava por horas pelo sorriso bonito.
ela usava verde.

---------------------------------------------------------------------------

com piadinhas distraía.
nunca fui engraçado. engoli a timidez.
inventava desculpas para mudar de lugar. ela fingia que não notava.
de chimichuris a ensaladas, me ensinava novas receitas.
eu mostrava samba e falava sobre literatura argentina.
cortázar não soava estranho, do borges ela gostava.
ela dizia que ciencias sociales es lindo, eu invejava seu curso de gastronomia.

-----------------------------------------------------------------------------

usava um vestido branco.
era meu último dia. não queria sair dali.
troca de contatos e todo o blablabla.
caminhamos na praia e subimos nas pedras.
o sol descia. torcíamos para que ficasse escuro.
não muito.
eu te tocava devagar. tu tinha pressa.
não sabia como agir. estranhamento e diferenças culturais.
gostava quando puxava o cabelo.
os olhos puxados não se abriam mais.
"sera que ellos nos escucharan de todo?"
perguntava sobre os que passavam.

------------------------------------------------------------------------------

fingia não ligar.
seria por 3 dias. nada mais que isso.
descobri que ainda era mole. era inevitável.
mentia para os outros que não.
para mim mesmo era difícil de enganar.
senti ciúmes. zelo, em espanhol.
depois de bebidas conversas iam e eu estava sentado com meu cigarro.
ela gostava de bailar. eu não sabia.
"voy volver a mi casa. me gusta ter te conocido."
mais um dia se vai.

à beira do mar aberto

eu te dizia que os gregos chamavam de aurora do dedo róseos. não lembro se inventei ou lí em algum lugar. eu sempre arranjava uma desculpa para não estar ali. andava desatento e apático. na fuga para o cigarro tu dizia pra ficarmos mais um pouco e eu inventava uma desculpa para voltar logo. tu sorria tanto e eu fingia que não via. fui te contaminando. no fim das contas tu passou a andar de cabeça baixa ao fundo. olhava para a sombra que não se movia. jogávamos areia para ver o vento espalhar. faltou um canto, um quarto a dois. não me importei. estava deixando tudo para depois. dormiamos com a tv ligada. tu correu para o mar com teu biquini verde e eu não pude não notar, mas tu voltava a meu colo e eu já não me importava mais. tu me dizia tanta coisa e eu fingia escutar. não ignorava as consequências óbvias, mas não me importava. tu me dizia que nada era óbvio. olhamos os livros na estrada. um costume típico para um final (in)esperado. as dunas, a casinha vermelha, milhares de fotos, os abraços deixados para trás, as fones de ouvido divididos me fazem lembrar do que deixei partir. o cenário me causa dor. "tenho pressa, embora não pareça."

28 de jan. de 2010

"Eu quero mais, passei de fase.
Pra mim esse ano acabou e daí?
Se tu acha que vou desistir de viver de mim, foi mal aí.
Não importa se eu ganhe ou empate.
Se tu quer mais água no mate.
Pra onde eu vou, fugir dos complôs é grátis.

Pra ser sincero, quero ver o mais belo empate."



não saberia dizer de que estou atrás. fase de descobertas. ví que ainda resta um pouco de carne onde pensava ser só pedra. me descobri doce e não amargo com me disseram que havia me transformado. aprendi frases em espanhol. não larguei os cigarros. minha tosse diminuiu e minha asma se foi. melhoras de um período anterior baseado na ansiedade. perdi uma camada de pele e junto com ela uma parte do todo branquelo. minhas flores tatuadas floresceram de novo. flores do campo. a areia insiste em ficar presa entre meus dedos. a chuva me molhou e levou todo o lodo que me encobria. achava que sonhava, mas não conseguia dormir. vou fumar mais um cigarro à beira mar.

21 de jan. de 2010

em brusque

não sabia se o fato de olhar mais as vitrines femininas significava que ele ainda pensava nela ou algum traço de homossexualidade reservada. ele sabia o que ela gostava. ela dizia que ele não gostava, mas era pura implicância. ele se deu conta que estava cada vez mais longe. ela não fazia nada pra evitar. armadilhas do destino. bonita sua camiseta listrada de verdes por uma pechincha.

19 de jan. de 2010

de lembranças, não comentara. é algo que não precisa ser falado. do que ficava, ela fazia questão de apagar rapidamente, não sei se era bom ou ruim. não conseguia não remeter algumas leituras, palavras, conversas, as manchas na cama e as que pensava em fazer. engraçado que o amor póstumo não é ódio e muito menos apatia, mas sim marcas. mas nem todas são cicatrizes.

15 de jan. de 2010

uma vez escrevi um texto com todas as características que eu buscava em "um alguém" pra estar do meu lado. deixo tudo isso de lado agora. apenas procuro empatia.

da não busca de um balão

não gosto de balões.
balões logo murcham
e perdem a graça.
não são como flores
que se guardam dentro de um livro
e mancham as páginas
de um colorê bonito.

14 de jan. de 2010

epifania

quando criança jogava no filperama.
taito não engole fichas.
dois tapinhas na máquina e bastavam.
me batem na testa,
devo parar de engolí-las?

12 de jan. de 2010

sobre um orgão (não)regenerativo

já pensei que fosse de pedra.
já foi enfarofado.
colocarei o punho no lugar. lições de biologia.
sempre quis tocar bateria, as batidas me atraiam.
acho que não mais baterá, pois ficou perdido por ai.
em um lixo qualquer, pela capital do estado, eu ainda tropeço.
torço pra que ainda caiba.
mas vai saber.
me disseram que é assim.
se dá pra colocar um novo no lugar, mas que as vezes se joga esse fora e o antigo aparece de novo cheio de cicatrizes.
não acreditei.

11 de jan. de 2010

dos afastamentos e o suor frio

quanto menos percebia, mais se afastava.
ele não sabia o que fazer, desistiu de correr, de fugir.
parou pra juntar as moedas que derrubara no chão.
encontrou um bilhete que lhe contava muitas coisas que queria saber, mas ele não sabia se conseguiria acreditar de novo.
se viu perdido no escuro.
um dia ele já soube o que queria, logo passou.
a minha tosse continua e eu sinto frio nesses dias.
queria acender um incenso, mas "lhe dava alergia" pensou ele.
trocou os lençois e desligou o ventilador.
não dormiria como antes.